7 de outubro de 2017

“Sweet as Broken Dates: Lost Somali Tapes from the Horn of Africa” (Ostinato, 2017)


Nem se dava pela falta deles, em meados de 90, quando saiu “The Rough Guide to World Music”. Aliás, num blurb, Andy Kershaw, da BBC, ia ao encontro do que pensaria um leigo na matéria: “Um trabalho de pesquisa lunático”. Certo. Não obstante, esse “A a Z de Música, Músicos e Discos” ia da Argélia ao Zimbabué, sim, mas deixava de fora Chade, Djibuti, Líbia e Somália. Ou seja, nos termos da construção de uma narrativa cultural africana, fazia aos cidadãos desses países o que faz, agora, em matéria de restrições à imigração, o Departamento de Estado norte-americano: varria-os para debaixo do tapete – ou do topete, no caso de Trump. Não admira, portanto, que, sempre que o assunto vem à baila, se pareça falar de doentes de Alzheimer, cheios de passado mas sem memória nenhuma. Referir-se-á a isso, este subtítulo: cassetes perdidas do Corno de África. Pois, em rigor, a maior parte dos temas que aqui está não provem exatamente da Arca da Aliança a que se refere o seu organizador em notas de apresentação (um acervo de 10.000 títulos de música somali que escapou aos bombardeamentos do regime de Siad Barre e que hoje se encontra no Centro Cultural de Hargeisa). 

De facto, este “Sweet as Broken Dates” é demasiado ambicioso – ou de menos, conforme a perspetiva – para se restringir a uma fonte, só, quando o contacto com a diáspora permite o acesso a muitas mais: “Este projeto levou-nos de Minesota e Mogadíscio à Malásia”, conta Vik Sohonie, fundador da Ostinato. Quiçá reagindo à sua atual fortificação a ocidente, Sohonie e o seu principal colaborador, Nicolas Sheikholeslami, preferem diluir fronteiras, incluindo no alinhamento desta sua extraordinária antologia djibutianos como Nimco Jamaac ou 4 Mars. Também cronologicamente se salta de 1969 para 1996 e de 1999 para 1988, embora as datas mais recentes digam respeito a cantoras no exílio, claro. Gente como Aamina Camaari, Hibo Nuura, Fadumiina Hilowle, Maryan Naasir, Sahra Dawo, Xaawo Hiiraan ou Faadumo Qaasim, que passava pela trupe Waaberi e que dizia da música de dança do seu país (que realmente não se compara à de nenhum outro) o que Fedora, de “Sassaricando”, dizia de um beijo na sua boca: que tem o sabor das tâmaras maduras.

Sem comentários:

Enviar um comentário