10 de março de 2018

Brahms: Cello Sonatas (Erato, 2018)



As placas tectónicas (embora teutónicas pareça ser uma palavra mais apropriada) separaram-se há muito. Aliás, partindo do princípio que não se deixa tomar pelo desejo indiscreto de saber ao certo que “farpas” lançou recentemente Luís Filipe Reis a Tony Carreira (descrito como “guerra de cantores românticos”, pela revista “Flash”), quem no Google escrever “Guerra dos Românticos” há de lá ir parar: resumindo, ao rifte entre correligionários de Brahms, por um lado, e de Wagner, por outro, em meados do século XIX. Mas em França, como é óbvio, a questão nem se chegou a pôr. Bastará, nesse sentido, lembrar um ensaio de Baudelaire, escrito na língua dos comunicados de imprensa, em que o poeta se dizia “impotente”, “subjugado e transportado” pela música de Wagner, incapaz de se defender do seu “poder irresistível”. Josiah Fisk, de modo indireto, na segunda edição de “Composers on Music: Eight Centuries of Writings”, em 1997, documentou aqueles que se dedicaram a tirar o pêlo às peças de Brahms e limpar-lhes o carnaz: Lalo (“Não nasceu para músico; o que possui de inventivo é, na realidade, insignificante ou imitativo. Dir-se-ia um homem que tem de procurar à direita e à esquerda aquilo que não encontra dentro de si”), Ravel (“Na arte, não é possível ser-se apenas artesão. A mera vontade de produzir seja o que for é estéril [se não houver inspiração]. É o que a obra de Brahms demonstra”), Fauré (“Não possui nada de verdadeiramente triunfante”), Dukas (“É sempre engenhoso, frequentemente interessante, jamais comovente”), Milhaud (“A música de Brahms escapa-me”) ou Poulenc (“Deixa-me indiferente”). 

Credo! Dir-se-ia a única pessoa em fato de banho numa praia de nudistas. Quão irónico será, então, que seja pelo filtro da sensibilidade gálica que melhor se lhe reconhece hoje a sensualidade – no que diz respeito às sonatas para violoncelo e piano, no último punhado de anos destacam-se Victor Julien-Laferrière e Adam Laloum (na Mirare), Bruno Philippe e Tanguy de Williencourt (na Évidence), Anne Gastinel e François-Frederic Guy (na Naïve), Ophélie Gaillard e Louis Schwizgebel-Wang (na Aparté) e Hélène Grimaud e Sol Gabetta (na Deutsche Grammophon), gente que recordará os nomes de Paul Tortelier e Pierre Fournier. Pois, adicione-se-lhe Tharaud e Queyras, outro par que sabe como uma peça de roupa a mais nesta tímida música pode ser meio caminho para lhe desvelar a intimidade.

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